O Grupo de Pesquisa BikeTour Cicloturismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) tem o objetivo de ampliar o conhecimento sobre o emergente tema de pesquisa e contribuir para o desenvolvimento da ciclomobilidade no Brasil, especialmente em Santa Catarina. Criado em 2022, é o único grupo de pesquisa focado no cicloturismo (urbano, rural e em unidades de conservação) e o primeiro na região sul do país.
De acordo com o professor Marcos Bosquetti, do Departamento de Ciências da Administração (CAD/CSE/UFSC) e líder do grupo, “o cicloturismo é um indutor do desenvolvimento territorial sustentável e uma alternativa ao modelo dominante de turismo de massa com seus impactos negativos no meio ambiente e na sociedade. Trata-se de um segmento do turismo sustentável. Isto, por si só, já justifica desenvolver pesquisa sobre cicloturismo. Além do mais, o Brasil, apesar do seu considerável potencial para o cicloturismo, ainda carece de estudos e propostas para alavancar este segmento bastante promissor para o país.”
Segundo o professor, na Europa o cicloturismo gera 520 mil empregos e movimenta 45 bilhões de euros por ano. Os países da comunidade europeia estão interligados pela EuroVelo, uma rede de ciclovias/rotas de longa distância (equivalente a uma highway para bicicletas) com mais de 90 mil km de extensão, sem considerar as ciclovias urbanas e as rotas e circuitos de cicloturismo de cada país. No Brasil, que é quase do tamanho da Europa, o cicloturismo não possui 5% desses números.
Embora recente, o grupo Biketour tem um projeto de extensão voltado para promover a cultura da bicicleta e a ciclomobilidade na Universidade e na Grande Florianópolis. Também participou das iniciativas do MobiliCampus, da União dos Ciclistas do Brasil, da AmoBici Floripa e do Projeto Campus-Parque-Cidade UFSC. O BikeTour também representa a UFSC nas comunidades internacionais Mobility-Week, Sport & Development, Vélo & Territoires e Eco-Cicle Community.
Cicloturismo e unidades de conservação
Entre as publicações do grupo, destaca-se o artigo “Cicloturismo em unidades de conservação: o caso de sucesso Rota da Baleia Franca (SC)”, publicado na Revista de Turismo Contemporâneo. É o primeiro estudo a relacionar cicloturismo e unidades de conservação.
Ao analisar o Programa de Cicloturismo Rota da Baleia Franca, os pesquisadores destacaram uma série de contribuições da iniciativa: a geração de receita, na baixa temporada, para os pequenos negócios nos setores de hospedagem, alimentação e artesanato, contribuindo para a superação dos desafios da sazonalidade turística no litoral; a promoção da APA da Baleia Franca no país e no exterior, posicionando-a, inclusive, como uma referência internacional em destinos de cicloturismo no Brasil; a ampliação do portfólio de atrações turísticas divulgado pelos municípios da APA e pela Agência de Desenvolvimento do Turismo de Santa Catarina (SANTUR); a atração de turistas com interesse nas iniciativas locais de agroecologia, preservação e educação ambiental; e a promoção e valorização do patrimônio ambiental e cultural do território.
“Por fim, os resultados deste estudo de caso apontam que a oferta de roteiros de cicloturismo em UCs tem o potencial de alavancar três movimentos relevantes para a sociedade: o uso da bicicleta, o uso público de UCs e o desenvolvimento do turismo sustentável”, afirmam os autores.
Atualmente o grupo está trabalhando na publicação do livro Desenvolvimento do Cicloturismo: lições da Europa ‘tropicalizadas’ para o Brasil, compartilhando os resultados de uma pesquisa de campo realizada em 17 países do continente europeu.
Movimento Slow Cities
Vários motivos levaram o professor Bosquetti a se interessar pelo tema da pesquisa: o potencial do cicloturismo no Brasil; a importância de inserir a Universidade no processo de estudar e planejar o desenvolvimento deste segmento do turismo sustentável; e sua própria experiência com cicloviagens pelo sul do Brasil e no exterior.
“Eu já fiz viagens de turismo utilizando carro, moto, bicicleta e até veleiro oceânico, mas o ritmo contemplativo da bicicleta proporciona ao ciclista a oportunidade de desfrutar da viagem tanto quanto do destino e promove maior conexão com a natureza e com a comunidade local”, avalia. Segundo o professor, o cicloturismo está alinhado com a filosofia slow nascida na Itália, cujo propósito é reduzir o ritmo da vida nas cidades (movimento slow cities), oferecer uma alternativa ao fast food (movimento slow food) e proporcionar um estilo de turismo que prioriza a qualidade da experiência turística (movimento slow travel).
Na UFSC, há professores e estudantes interessados no tema, que integram o projeto de extensão voltado para promover a cultura da bicicleta na Universidade. O grupo também trabalha de forma colaborativa com o projeto Campus-Parque-Cidade, do Grupo de Pesquisa em Ecologia e Desenho Urbano (Gipedu), coordenado pelo professor Francisco Carneiro Ferreira, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC.
Pioneiros e rede colaborativa
Na plataforma CNPq dos Grupos de Pesquisa há apenas dois voltados para o cicloturismo: o pioneiro no Brasil Experiências em Turismo e Transporte Ativo, da Universidade Federal Fluminense (ETTA/UFF), em Niterói (RJ), e o BikeTour da UFSC. Há ainda o Instituto PLANETT – Planejamento de Turismo e Transportes, localizado no Rio de Janeiro (RJ), que tem como escopo vários temas, incluindo o cicloturismo, mas não está diretamente vinculado a uma universidade.
Os grupos trabalham de forma integrada. A professora Priscila Edra, fundadora do ETTA, e Luiz Saldanha, diretor do PLANETT, fazem parte do BikeTour UFSC. “No início de 2023, eu passei a integrar o Grupo ETTA e colaboro com o PLANETT como membro da comissão organizadora da ConVale – Conferência de Cicloturismo no Vale Europeu. Também fazemos parte do Comitê Científico do Encontro para o Desenvolvimento do Cicloturismo (EDESC), o único evento anual sobre cicloturismo. Está na sua 4ª edição e foi criado pela professora Edra e o Saldanha.”
No BikeTour também há integrantes que coordenam projetos de extensão promovendo o uso da bicicleta para qualidade de vida e mobilidade urbana, como o Programa CicloVida, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e o Programa Pedagogia Urbana, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB.) Em Florianópolis, o BikeTour também conta com a colaboração do professor Tiago Savi Mondo, do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), que pesquisa marketing de destinos turísticos. “Nós estamos iniciando a construção de uma rede colaborativa de pesquisa voltada para o desenvolvimento do cicloturismo no Brasil”, destaca Bosquetti.
Estado promissor
Bosquetti aponta que Santa Catarina é um dos estados mais promissores para o desenvolvimento do cicloturismo. “Nosso estado abriga o primeiro circuito oficial de cicloturismo do Brasil, o Circuito de Cicloturismo Vale Europeu. O clima temperado é propício para o uso da bicicleta nas quatro estações do ano, as paisagens exuberantes do litoral e da serra catarinense, bem como sua cultura e gastronomia atraem cicloturistas de várias regiões do país e do exterior.”
Florianópolis também tem potencial enorme para o cicloturismo urbano. Bosquetti destaca que descobrir os encantos da ilha de carro pode ser rápido demais e muitas vezes lento demais devido ao congestionamento do trânsito. Por outro lado, percorrer os trechos a pé demandaria muito tempo.
“Nos últimos anos a malha cicloviária de Floripa tem se expandido de forma significativa, mas ainda existe um longo percurso até tornar Florianópolis uma cidade totalmente ciclável. Mas é preciso reconhecer que, aos poucos, a ciclomobilidade vem conquistando espaço, respeito e o reconhecimento da população de que a bicicleta é um meio de transporte ativo e sustentável que proporciona inúmeros benefícios para a mobilidade na ilha e para a sociedade como um todo.”
O problema da capital catarinense também é enfrentado no país inteiro. “O principal desafio para o cicloturismo em Florianópolis, e no Brasil como um todo, ainda está relacionado à falta de uma infraestrutura adequada para a ciclomobilidade urbana, que proporcione mais segurança para os ciclistas, como ciclovias, ciclofaixas, sinalização e a educação no trânsito, tanto por parte dos motoristas como dos ciclistas e pedestres.”
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